Não
nasci homem. Fui criada em meio a bonecas e cor de rosa, mas desde sempre tive
um apreço por todas as coisas que eu, teoricamente, deveria ser delicada demais
pra fazer. Em desacordo com o mundo, até tentei investir na carreira
futebolística. No campo e nas quadras fui um desastre. Se Deus me deu algum
dom, com certeza não foi com a bola nos pés. Mas aí, como quem não desiste
fácil, descobri que eu poderia ter o meu lugar no meio desse espetáculo. Além
das quatro linhas, é fato, mas, ainda assim, o meu lugar.
Não
posso me fardar e entrar em campo para dividir cada bola como se fosse a
última, mas posso ocupar o meu cativo lugar nas arquibancadas e implorar para
que os 11 no gramado se doem com a mesma bravura que eu me doaria. Eu acredito,
talvez ingênua e inocentemente, que em cada um daqueles seletos homens
escolhidos para defender as cores de um clube e de uma cidade e de honrar o amor
de toda uma multidão, ainda há um pouco de apreço e respeito à camisa. Além das
folhas de pagamentos de valores estratosféricos, além do status, além da
vitrine que representa jogar em um time pequeno, mas de série A.
Na
nossa breve, mas brilhante história, criamos uma identidade. Ou talvez seja
simplesmente uma sina. Todas as conquistas foram fruto de sangue, suor e
lágrimas. De coração na ponta da chuteira. Todos os títulos, independente da
relevância. Todos os acessos, até a consagração de estar entre os 20 melhores
times do Brasil. Nada veio fácil. Por isso me surpreende, ao mesmo tempo em que
indigna, ver que ainda existem “atletas” que ousam não honrar e defender com
unhas e dentes o nosso lugar, a nossa história, as nossas cores, a nossa
bandeira, a nossa paixão.
Tenho
ouvido boatos – e implorado para que sejam, de fato, apenas boatos – de jogadores
indiferentes às reações da torcida quanto à má fase que se instaurou no clube.
Nessas horas me pergunto “o que estão fazendo com a minha Chape?”. Feliz e
infelizmente, o progresso chegou.
A
minha súplica, e a de tantos outros torcedores que trabalham incansavelmente, ganham
seus míseros salários, investem boa parte disso para ver o time do coração
jogar, sob sol, chuva, frio ou calor, é que haja hombridade e dignidade em cada
um dos que tem a honra de vestir a camisa da Chapecoense. Nunca nos entregamos
sem lutar e eu espero, do fundo do meu coração, não ter que contar aos meus
filhos e netos que presenciei a primeira vez em que isso aconteceu.
Defendam
as nossas cores como defenderiam as suas famílias, os seus deuses, as suas
crenças. Revoltem-se contra as vais vindas da arquibancada, mas, por favor,
saibam canalizá-las em combustível e motivação para mostrar que são maiores do
que as críticas. É essa a nossa intenção: colocá-los à prova. Mostrem
comprometimento. Anotem nas cabeceiras de suas camas a palavra MERECIMENTO e se
lembrem sempre, antes de dormir ou logo ao acordar, que tudo o que se colhe e
fruto do que se planta. Se não estiverem dispostos a isso, peçam pra sair.
No mais, seguimos jogando junto, "nas alegrias e nas horas mais difíceis". Não tá morto quem peleia. Vamos, Chape.